Pra todo mundo que acha que eu sou um playboy que nasceu em berço de ouro, não tem a menor ideia do que passei nessa vida de meu deus. Eu não tive que cortar cana, carpir mato ou plantar bananeira porque eu moro na cidade. Se eu morasse no campo, pode ter certeza que eu seria o responsável por pegar a merda do cavalo.
Pra começar, nunca tive emprego fixo, trabalho fixo ou remuneração fixa. Curto ser nômade, andar por aí, conhecer novas pessoas… NÃÃÃÃO! Eu não curto nada disso. Só queria um mísero emprego fixo, com carteira assinada pra eu mostrar pra minha vó e dizer: “Tá vendo, Vó, trabalho no Programa do Gugu”. Como ela mal sabe ler e não tem ideia de que merda alguém faz em publicidade, é mais fácil dizer isso, porque ela é hiper fã do Loirinho e vai sentir orgulho de mim, garantindo meus R$30 reais de presente no Natal.
Mas como a situação tá difícil e ninguém tá afim de dar um emprego, então tô nem aí. Vou continuar acordando tarde, mesmo sendo um dos caras mais trabalhadores e batalhadores desse Brasil.

Minha carreira profissional começou logo cedo. Tinha um ótimo perfil empreendedor e pensava em ficar rico a curto prazo. Logo no meu primeiro emprego, fui boicotado por uma senhora que acabou com todas as minhas aspirações: minha mãe.
Eu gostava muito de tomar gelinho (geladinho, sacolé ou outros nomes que não sei), até porque é mais rápido, é mais jovem mesmo. Sem contar que era baratinho. Na época, custava 15 centavos os feitos com suco natural. Muito bons. Sem contar os gelões, que pareciam uma pica grossa e eram vendidos por apenas 25 centavos. Isso soou gay, relevem.
Pois bem. Diante do impasse de tomar muitos gelinhos, decidi produzir minha própria série para tomar, vender e ganhar uma grana. Comprava altos Ki-sucos (Tang? HAHAHA. Tang era o triplo do preço de um Ki-suco e eu, com pensamento voltado a negócios, queria maximizar meus lucros) para fazer os meus. Uva, Graviola, Framboesa, Morango… em média, 1 litro de ki-suco fazia 15 gelinhos. Como queria desbancar a concorrência, vendia meus gelinhos a 10 centavos, logo, 15 gelinhos a 10 centavos, iriam me render R$1,50 bruto. Tirando os 30 centavos do suco, minha mão de obra, luz, água, açúcar, os gelinhos que meu pai pegava… acho que dava pra ganhar uns 50 centavos a cada 15 feitos. Super grana. Dava pra comprar três mini-raias (pipa).
Como bom comunicador desde pequeno, coloquei uma plaquinha no portão anunciando que eu tinha entrado no ramo. Não demorou pra todos os meus vizinhos virem comprar e contraírem dívidas de 40 centavos, 60 centavos, o que me deixava extremamente puto. Porém, o que me deixou mais puto foi minha mãe. Ela ficou com vergonha da minha atitude empreendedora e arrancou minha plaquinha: “Para de ser besta. Dá todos esses gelinhos, não vai vender pra ninguém”. E saiu distribuindo pra quem quer que fosse minhas obras-primas-alimentícias. Noooooooossa. Sou um cara de muito bom coração, senão eu JAMAIS teria perdoado essa atitude dela.
Ok, mãe. Não quer que eu seja vendedor de gelinho, uma profissão honesta, digna, então vou fazer uns bicos na Páscoa. Pra vocês terem uma ideia, me tornei o maior responsável pelo faturamento de uma senhora que fazia Ovos de Páscoa. E qual era meu cargo? Vendedor de rifas. Em troca do meu trabalho, ela me dava um ovo igual ao que estava sendo rifado. Bem legal. Juro que conseguia vender 5 rifas de 100 números em uma semana. Eu era pequeno, “inocente” e todo mundo comprava. Uma pena que eles nunca souberam que eu era o maior fraudador da história das rifas. Conseguia fazer um esquema com a luminária que eu via o nome de quem ia ganhar antes. Em troca desse nome, oferecia a uma pessoa X por um preço mais elevado. Negócios são negócios. E criança quer sempre comprar algo útil, tipo… mais pipas.

Tive esse emprego temporário por uns 6 anos. Como eu mal ganhava Ovo de Páscoa dos meus pais/parentes, consegui alimentar minha família nesse período.
Já mais crescido, decidi que iria trabalhar com o que eu gostava de verdade: pipas. Eu gostava muito de empinar pipa (ainda gosto) e queria fazer os meus pra não ter que gastar comprando novos. Fui contratado no Cel Pipas pra fechar MINI-RAIAS, que são menores que as raias.

O pagamento variava de acordo com a produção. Para cada raião fechado, ele pagava 3 centavos e meio. Para cada raia fechada, ele pagava 2 centavos e meio. Já eu, um escravo cambojano, fechava as porras das MINI-RAIAS… e ganhava 1 centavo e meio por cada fechamento.
Eu já sabia fazer, tanto que achei que seria fácil. Fiz 600 pipas em 5 dias e pedi as contas, porque empinar pipa era bem mais legal do que fazê-las. Saldo final: 9 reais em uma semana e um sorriso de orelha a orelha por poder comprar todos os pipas que eu mesmo fiz. Tudo bichado, penso, torto, mas beleza, hehehe.
No ano seguinte, me arrisquei na pior profissão do mundo: ser estoquista na Handbook do shopping Center Norte (SP). Acho que não há algo pior e mais humilhante do que ficar procurando roupas para um bando de imbecis, só porque você ainda não tem 18 anos e não pode ser vendedor. Que desgraça. Trabalhava das OITO da manhã até as DUAS da manhã em regime semiaberto no período do Natal. Até os presos veem sua família no Natal… só eu que não comi peru porque tava trabalhando. Puta vida miserável. Ainda bem que era temporário, porque eu não ia aguentar mais de 1 mês naquele inferno.
Passado as babaquices infantis de tentar conseguir dinheiro para ir a domingueiras e matinês, entrei na faculdade e me conscientizei que dali pra frente só arrumaria trabalhos fixos. Quisera eu. O primeiro que arrumei foi um freelance para um bando de universitários de uma faculdadezinha meia boca para fazer direção de arte pro trabalho de conclusão de curso deles. Totalmente estressante, porque os animais não sabiam a diferença entre Pantone e CMYK.
Seguindo a linha, virei estagiário numa das melhores agências de São Paulo e consegui remuneração fixa por vários meses. Ufa! Até que enfim. Ganhar VR (vale-refeição) mensalmente parece um presente divino. Eu economizava muito no almoço para levar minha namorada pra ir jantar no final de semana com o santo VR. Salário de estagiário é triste. Nunca que eu ia conseguir bancar alguma coisa sem meu amado, idolatrado, lindo e fofuxo VR. Já que você pensou nisso, pobre é tua mãe.
Em paralelo à faculdade e aos estágios, criei 700 comunidades do Orkut que não me serviram pra bosta nenhuma, porque me recusei a ganhar dinheiro com propaganda pra não deixar “visualmente feio o layout”. Como sou imbecil. Muito imbecil.
Desisti de criar comunidades e passei a criar frases pra concursos culturais pela internet. Ganhei algumas coisinhas e consegui me sustentar com um prêmio que vendi.
Hoje sou considerado blogueiro. Cheguei ao fundo do poço.
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